domingo, 11 de junho de 2017

CAMILO &M VIANA
[1857: “velha” como “nova” (19)]


Extraída de velha carta de Camilo a José Barbosa e Silva (JBS), eis, paciente leitor, mais uma nova referência ao Aurora do Lima e conexos. É a

4.ª)
A «Aurora» parece-me bem. As cartas do Novaes revellam ingenho vêsgo; mas remedeiam. Os art[ig]os são substanciosos; e, se me permittes a graça, o de 3.ª feira era substancioso de mais. Offerece as ignarias[*] que mencionas ao Visconde. Se Viana tivesse um bom estatuto de pusturas municipaes seria elle o primeiro entulho removido.
Os folhetins, como verás, vão entrar regularm[en]te. Não tem sido minha a culpa. Eu hoje acabo o q[ue] principio. Não te deixarei ficar mal em q[uan]to á quantidade. Estou a largar a «Verdade» por dias […   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …   …]. O S[ebasti]am de Sousa é um modêlo de bons moços: dá-lhe um apertão d’amigo pelas suas linhas.» [Em carta datada de 10/07/1856]
{BARBOSA, [1919]: 7-8. Respeitada grafia da edição consultada.
Também em CABRAL, 1984 (I): 103-104}
[*] Cabral transcreve «iguarias»; «ignarias» é «um lapso tipográfico» [CABRAL, 1984 (I): 105]. Co(n)textualmente evidente.

Este excerto merece uma leitura renovada, ou seja, algumas observações complementares.
Camilo mostra seguir com atenção crítica o Aurora. Avalia, positivamente, o jornal, destacando os artigos substanciosos. Não deixa, contudo, de considerar apenas remediáveis as cartas do Novais, fruto que são – critica ele - do engenho vesgo do epistológrafo.
Parece estranha a depreciação que Camilo faz das capacidades deste Novais. Trata-se de Faustino Xavier de Novais (1820-1869), «um dos escritores portuenses que mais estreitamente privou (sic) com Camilo Castelo Branco (na boémia e na literatura).» [CABRAL, 1986 (V): 71. Uma biografia mais desenvolvida deste amigo do Escritor e relações entre ambos, ver id.: 71-74 e/ou 20032: 559-560; também PIMENTEL, 1890: 179-180.]
Faustino de Novais era, pois, colaborador do Aurora. Assinava, porém, com o pseudónimo J. G., por vezes, João G. Era uma forma de competir com João Júnior, pseudónimo com que Camilo subscrevia, habitualmente, a sua colaboração neste jornal. Mas, como se verá, quando se ler e comentar referências futuras, era sobretudo o nosso literato-jornalista que receava a concorrência deste folhetinista, dramaturgo e poeta satírico. Que à roda dos amigos portuenses do jovem Barbosa e Silva também pertenceu.

Passando aos artigos substanciosos, Camilo diz ter gostado, por demais, de um de JBS. E a propósito, refere, depreciativamente, um Visconde.
Quem é este titular?
Gaspar de Azevedo de Araújo e Gama, informa Xavier Barbosa. «Foi por duas vezes governador civil do districto de Vianna do Castello: a primeira, desde 6 de Janeiro de 1851 até 4 de Junho do mesmo anno; a segunda, quando já Visconde de Sam Paio dos Arcos de Val de Vez, desde 6 de Outubro de 1851 até 8 de Agosto de 1857.» {BARBOSA, [1919]: 7, nota 4. Respeitada a grafia da edição consultada.} Este visconde voltará a ser alvo de ataques políticos, em próximas referências epistolares.

Resta observar que, respondendo, certamente, ao não envio, a tempo, das tiras [o Aurora havia começado a transcrever «Peregrinação sobre a Face do Globo», há poucos dias], Camilo culpa terceiros: a redação d’A Verdade, provavelmente. Era neste jornal portuense que saía o original de cada folhetim. [(Re)ver “post” anterior] O Escritor assegura, contudo, não faltar com os folhetins ao amigo de Viana: «Eu hoje acabo o que principio.» - afirma. O Escritor precisava de melhorar e/ou preservar a sua imagem de profissional competente e cumpridor. O cargo futuro de redator do Aurora é objetivo que persegue. A par, necessariamente, da respetiva remuneração mensal.

Por último, Camilo refere-se a Sebastião de Sousa, de quem já falei no “post” anterior. Redator do Aurora, o seu concorrente ao mesmo lugar elogia-lhe as qualidades morais e agradece-lhe as linhas que a seu respeito escrevera no jornal. Compreende-se! Quando assumir a redação do Aurora, o Escritor vai precisar da sua ajuda. Evidentemente.
A correspondência de Camilo para JBS, em torno do seu projeto para o ainda novel periódico vianês, vai continuar.

Então, até ao próximo!
E continue a (re)ler Camilo. É uma prenda que dá a si próprio, amigo leitor.

Referências:
BARBOSA, Luís Xavier, [1919]: Cem Cartas de Camillo. Lisboa: Portugal-Brasil Limitada, Sociedade Editora.
CABRAL, Alexandre Cabral, 1984: Correspondência de Camilo Castelo Branco com os Irmãos Barbosa e Silva – I. (Escolha, prefácio e comentários de). Lisboa: Horizonte.
-------------, 1986: Correspondência de Camilo Castelo Branco (Vol. V). Lisboa: Horizonte.
-------------, 20032: Dicionário de Camilo Castelo Branco. Lisboa: Caminho.
PIMENTEL, Alberto, 1890: O Romance do Romancista – Vida do Camillo Castello Branco. Lisboa: Francisco Pastor.

Sem comentários:

Enviar um comentário